quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Música é verdade

Não consigo não prestar atenção em uma música,
seria mais fácil pedir a um interlocutor calar-se
do que desviar minha atenção para longe da harmonia,
dos acordes, da melodia,
do prazer inenarrável proveniente dos sons.

Dizem que o caminho entre a razão e o coração é longo, árduo,
mas o caminho do meu ouvido ao coração
é quase inexistente, pois ambos vivem juntos.

Os sons são milagres, notas musicais são milagres,
a voz que canta é um milagre,
a ciência é falsa, mentirosa,

explica a tudo e todos, mas não tem coração.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Sobre o patamar da escada

Sobre o patamar da escada, como se fosse o cimo de um outeiro, observava os pacíficos bebedores, os bebedores problema, os bebedores esporádicos e meus próprios pensamentos que pairavam sobre o salão. Continuava a descer e mais dois degraus abaixo comecei a perceber a necessidade de definir a qual dessas espécies pertenço. Mas rapidamente torna-se nítida minha condição de igual a todos e ao mesmo tempo diferente de todos. Igual, pois todos neste momento bebemos e não há um pensamento limpo nesse lugar e nenhuma boca capaz de proferir algumas palavras sem antes levar um trago até garganta. Diferente, pois posso saber da minha condição verdadeira, a dos outros não passa de julgamento ou mera especulação que faço com os botões de minha camisa. A condição de igual aos outros os coloca na mesma condição da miséria humana que temo e vivo, pois dito por Cruz e Souza que nos apodrecimentos da matéria somos todos iguais na boca dos vermes que nos devorarão em plebeia fúria. Diga-se de passagem, que por aqui se encontram apenas ilustres e nobres, ilustres desocupados e nobres boêmios, que ao saírem cambaleantes ao final da noite ou despontar da alvorada, alguns chegarão a casa, outros dormirão em bancos e outros nas calçadas e sarjetas, diferentemente dos ordinários, que dormem cedo e acordam cedo.
A música que não gosto e ouço, continua a tocar, mas por obra do destino os músicos são bons, me agrada a maneira como tocam, porém o tipo de música me desagrada por completo, daquele tipo, feita pra não se prestar a atenção e servir de pano de fundo pra conversas de ébrios. Mas não consigo não prestar atenção em uma música, seria mais fácil pedir a um interlocutor calar-se do que desviar minha atenção para longe da harmonia, dos acordes, da melodia, do prazer inenarrável proveniente dos sons. Dizem que o caminho entre a razão e o coração é longo, árduo, mas o caminho do meu ouvido ao coração é quase inexistente, pois ambos vivem juntos. Os sons são milagres, notas musicais são milagres, a voz que canta é um milagre, a ciência é falsa, mentirosa, explica a tudo e todos, mas não tem coração. Enfim ao menos os músicos são bons e a função de uma música, que é emocionar, foi cumprida. Raiva, estou com raiva, muita raiva, e é essa a emoção que me foi dada por hora.
Pisei no último degrau decidido a me enquadrar numa condição de desigual, de indiferente, pois meus comparsas etílicos se deliciam em conversas acompanhadas de música e eu, nem me delicio com a música e nem com essa conversa sem sentindo entre mim, eu e meu racionalismo.
Pra fora! Fora daqui montado no cavalo de Álvaro, metendo-me as próprias esporas no lombo do cavalo que sou. Rápido, rápido... e saio daqui com uma esperança de um dia me reconhecer em um animal, e como Haller que se autodenominava o Lobo da Estepe, sabendo de sua própria condição, eu encontre um com o qual me identifique. Por vezes imaginei-me uma dessas enormes baleias que vagam anos pelos oceanos sem encontrar semelhante, mas a minha insistência em tentar fazer parte do contrato social da modernidade, ainda me coloca fora dos oceanos, distante da possibilidade querer saber como é realmente ser um solitário convicto. Por enquanto continuo apenas na minha condição de um solitário que anda por entre a gente, bebe em bares e frequenta espetáculos musicais e que sempre encontra alguém com quem ter e poder encontrar-se em outra hora ou outro bar... e dane-se a dondoca cabeça oca metida a intelectual que me ficou esperando voltar do banheiro. Vais feder como a princesa da ironia dos vermes, tu também, falsa donzela de pensar medíocre.

Realmente, vinho não me faz muito bem...

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Passagens de "Almoço Nu" de William S. Burroughs (II)

Uma transcrição de um diálogo entre personagens escritores. Faz parte de uma cena do filme ALMOÇO NU, baseado no livro homônimo escrito por William S. Burroughs. Trata-se de uma discussão se um texto deve ser reescrito ou não, cada personagem dá sua argumentação dizendo se é 'certo' ou 'errado'.  A conclusão do Bill(o personagem do próprio autor é fantástica: "Estou completamente fodido se for. Elimine todo pensamento racional, é essa minha conclusão.")

HANK :

"So you can't rewrite...
'cause to rewrite is to deceive and lie...
and you betray your own thoughts.
To rethink the flow and the rhythm
and the tumbling out of the words...
is a betrayal.
And it's a sin, Martin.
It's a sin."

MARTIN :

"I don't accept your, uh...
Catholic interpretation
of my compulsive, uh...
necessity to rewrite
every single word at least 100 times.
Guilt is...
Guilt is the key, not sin.
Guilt re-not writing
the best that I can.
Guilt re-not, uh, considering everything
from every possible angle.
Balancing everything."

HANK :

"Well, how about guilt
re-censoring your best thoughts?
Your most honest,
primitive, real thoughts...
because that's what your laborious
rewriting amounts to, Martin.
Is rewriting really censorship, Bill?"

BILL :

"Because I'm completely fucked if it is.
Exterminate all rational thought.
That is the conclusion I have come to."

sábado, 9 de novembro de 2013

GOOD DAY por Dresden Dolls


 (de Amanda Palmer, adaptado por Guilherme Coutinho)

Então você não quer ouvir minha boa canção?
E você não não quer ouvir como ando me virando
Com todas as porcarias que não dou conta
O sol está no céu e eu com minha solidão
Então você não quer ouvir sobre o meu bom dia?
Você tem coisas melhores a fazer do que me ouvir

Deus, tem sido um dia agradável, tudo indo a minha maneira
Levei o lixo pra for a e estou excitado…

Então você não quer me ouvir falar sobre meus bons amigos?
Você não tem estômago pra aguentar a verdade ou consequência
O sucesso no olho de quem vê

E está cada vez mais parecendo melhor olhando a sua indiferença

Não estou te sugerindo disposição para um interrogatório

Mas meu Deus, pense nas pontes que você tem incendiado
E aposto e penso mesmo que você sempre soube
Desde o começo
Melhor que você seja uma vadia do que um comum coração partido

Então siga adiante e fale de seu mal dia
Eu quero todos os detalhes de dor e miséria
Que tem imposto aos outros
Pois os considero meus irmãos e gosto

Deus, tem sido um dia agradável, tudo indo a minha maneira

Joguei croquet hoje e estou excitado

Recolhi as partes do meu ego despedaçado
E finalmente levei minha paz o mais longe que pudéssemos levar
Mas gostaria que você desse uma olhada no lugar
E gostaria de fazer mais do que sobreviver e esfregar em sua cara

Ei, tem sido um dia agradável, tudo indo a minha maneira

Tive bastante diversão hoje e estou excitado
Deus, tem sido um dia agradável, tudo indo a minha maneira

Desde quando você caiu fora estou excitado
Então, não quer ouvir sobre meu bom dia?

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

e feito Cruz e Souza


tu menina, que te achas especial
uma princesa perfumada, tal e qual
mas qual o que?

que já o dito na ironia dos vermes,

nos apodrecimentos da matéria
irás cheirar mal como outra qualquer
e nem terás o privilégio de Cubas
que humildemente dedicou as memórias
ao verme que lhe devorou a carne.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Passagens de "O Lobo da Estepe" de Hermann Hesse (I)


"(...)
Não entendo nem compartilho essas alegrias, embora estejam ao meu alcance, pelas quais milhares de outros tanto anseiam. Por outro lado, o que se passa comigo nos meus raros momentos de júbilo, aquilo que para mim é felicidade e vida e êxtase e exaltação, procura-o o mundo em geral nas obras de ficção; na vida parece-lhe absurdo. E, de fato, se o mundo tem razão, se essa música dos cafés, essas diversões em massa e esses tipos americanizados que se satisfazem com tão pouco têm razão, então estou errado, estou louco. Sou, na verdade, o Lobo da Estepe, como me digo tantas vezes — aquele animal extraviado que não encontra abrigo nem alegria nem alimento num mundo que lhe é estranho e incompreensível.
(...)"

em O Lobo da Estepe de Hermann Hesse

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Lou Reed se foi

    Domingo dia 27 de outubro de 2013, um pouco depois das 20:00h recebi um torpedo de uma amiga que dizia o seguinte : “Você soube da morte do Lou Reed?”
    Tive que engolir seco e duro um nó que se fez na minha garganta, retirei-me do ambiente onde estava em companhia de outras pessoas pra derramar sozinho uns fios de lágrimas.
    Em seguida comecei a me questionar o por que daquele choro, já que perdi algumas pessoas importantes na minha vida e não chorei. Fato é que parte do que sei da língua inglesa foi motivada pela vontade em entender o que ele escrevia, ter passado a gostar de Allan Poe foi por conta dele, algumas coisinhas que sei sobre Nova Iorque aprendi em suas músicas, centenas de outras bandas que conheço e gosto tocaram músicas dele ou do Velvet Underground, minha vontade de ler James Joyce é por conta dele, meu gosto musical foi praticamente construído sobre o que veio depois dele ou Velvet. Inúmeras razões eu tenho pra chorar e que se dane se alguém estiver vendo. Voltei ao lugar em que estava e falei da minha tristeza. 
    Obviamente existem outros grandes na música, mas ninguém foi tão presente e chegou tão perto de falar uma linguagem que me fez pensar, sentir, emocionar, aprender e muitas outras coisas.
Enfim, agradeço pelo dia em que ouvi a primeira vez uma música dele. Deve ter sido “Vicious”, não sei ao certo, mas o ano era 1983 e depois não parei de acompanhar. Trinta anos eternos...

domingo, 27 de outubro de 2013

Shamed moon

and the sun have waited all day long
better to say
the sun had wasted all the day
wating for the night to come
to feel and see what it would never can
the beauty of the dark and the silence of the night

at the other hand
it lended its brightness
to a full pale moon that happily sees
the sun and the light
the day and the night
the light and the dark

but shamefully hides one of its faces
the scary one
the bruised one
surely that one which really needs the light

Lua envergonhada
e o sol esperou por todo o dia
melhor dizendo
o sol desperdiçou todo o dia
esperando pela noite chegar
para sentir e ver o que jamais poderia
a beleza da escuridão e o silêncio da noite

por outro lado
emprestou seu brilho
a uma cheia e pálida lua, que alegremente vê
o sol e a luz
o dia e a noite
a luz e a escuridão

mas envergonhada esconde uma de suas faces
aquela assustada
aquela machucada
certamente aquela que realmente precisa da luz

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Rosa está morta(Rose is dead)

rosas lhe deram um nome
rosas selvagens lhe deram um perfume
e rosas secas lhe deram um amante

algumas rosas enfeitaram
seu suntuoso e furioso cabelo louro
um único espinho machucou seu dedo e coração
e aquela rosa era azul,
da mesma cor dos lindos e perfeitos
olhos azuis que eram dele

e o amor perfeito...
sempre recusou-se a crescer sobre o mesmo solo
onde o roxo e as rosas brancas de mármore
lhe deram o nome de solidão

sábado, 12 de outubro de 2013

Rose is dead

roses gave her a name
wild roses gave her a smell
and dry roses gave her a lover

some roses had adorned her imperious, furious blonde hair
a unique  thorn hurted her finger and heart
and that rose was blue, the same colour of his pefect pale blue eyes
his perfect love, for ever and ever rejected to grow
on the same ground where that purple and white marble roses gave her
the name of loneliness

domingo, 22 de setembro de 2013

Although, would you dare?

for Amanda Palmer

I'm not begging you to fill up my can
But you can colaborate to feel
I'm not asking you to pay my rent
But you can stay and look
It doesn't matter how long...

This is my work
And I call it art
This is my life
And we are not apart

Here I'm
Standing, staring at an empty space
And at your empty stare
And I'm not begging you to throw a penny
Inside of my fucking can

Although, would you dare?

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Alberto: meio homem, meio fantasma.


Precisamente às dez horas e vinte e dois minutos daquele dia, Alberto sentou-se na beirada de sua cama, sempre bem esticada e arrumada pela manhã, e ao afastar as almofadas encapadas com um crochê em barbante cru, retirar seus chinelos pantufas e esfregar as mãos no rosto, ocorreu-lhe o seguinte pensamento: “Eu sei o que é entristecer, realmente eu sei me entristecer, não sei se por hábito, necessidade ou auto piedade, mas sou ‘profissional’ nesse ramo. Será que outras pessoas se aborrecem tanto e com tanta freqüência como eu? Tenho clara noção de que o problema está em mim, e, diga-se de passagem, bem arraigado. Mas minha tendência em atribuir esse desconforto emocional está sempre direcionada ao outro. Aquele que frustra minhas expectativas sobre os acontecimentos, aquele que com suas idéias consegue ruir minhas convicções, todas construídas com muito sacrifício de tempo em leituras diárias sobre assuntos de meu interesse, e aquele, aquele, principalmente aquele mais jovem e estúpido que não viveu direito as amarguras da vida, a perda de uma esposa, a vida sem descendentes, ah como eu queria esganar alguns jovenzinhos idiotas. Talvez pensem que eu sou mais coitado que eles, mas sabe-se lá, somos livres para julgarmos quem quisermos e como quisermos.”
As mãos de Alberto acabaram de esfregar o rosto, como se o lavasse com água, mas com o que naquele momento esfregara seu rosto era mágoa e não água. E todo esse pensamento amargo não durou mais do que o subir e descer de suas mãos por duas vezes. O turbilhão de idéias ainda estaria por vir, ele sabe que seu travesseiro antialérgico, anti ácaro, anti mofo só não é anti amargura, anti ressentimentos. Se bem que pelas últimas noites tem sido um pouco diferente.
Ao deitar-se Alberto percebeu ainda, que ele mesmo é sua própria assombração: “E ainda tem essa, moro sozinho numa casa mal assombrada, mal assombrada por mim mesmo. E é bem verdade que me sinto como um fantasma. Tem sido assim desde que Eleonora morreu, levou consigo o amor que havia em mim, a gentileza que herdei de minha família, e o seu sorriso doce que não se desfazia. Sei que ela não levou nada disso, eu é que joguei tudo dentro de seu caixão antes de o fecharem para o cortejo. Fui um covarde, não tive coragem de ver o sepultamento e isso me custou revolta e indignação de outros, outros que não sabem o que sinto realmente e como seria insuportável viver com a imagem de um caixão levando em seu interior tudo que de bom havia em meu interior. Eleonora era a minha essência, minha vida, e essa é a razão pela qual passei a pensar que virei um fantasma que assombra a casa onde Eleonora viveu e não uma pessoa que mora onde viveu com Eleonora.”
E a sucessão de pensamentos derrotistas, mórbidos e melancólicos cessou ao formar-se em sua mente a imagem de um lugar com um curso de água límpida e corrente, de pouca profundidade e cercado de pedras limosas, com um musgo de um verde muito mais intenso que a sua própria esperança. Alberto chega até a ouvir o som da água, talvez essa a distração que o impeça em ouvir a voz de sua mente. Dessa maneira consegue adormecer por todas as noites. Vem sendo assim desde que iniciou as sessões de terapia, a tal condição que lhe impuseram para que continuasse no emprego.
Alberto sempre foi um funcionário responsável, sem muitos talentos ou habilidades, mas sempre sério e caprichoso. Sempre começou e terminou com êxito uma tarefa. Mas a morte de Eleonora foi como uma amputação de um membro. Tornara-se um deficiente. Nos dois últimos anos precisou da assistência médica da qual nunca precisou a vida inteira, e com muito sacrifício, amigos, colegas e médicos o convenceram a procurar um terapeuta. “Mas isso é coisa de gente fresca, sem pulso para encarar a vida.”
Sempre foi esse o pensamento de Alberto, mas quando da morte de Eleonora percebeu o quanto era fraco e cheio de dificuldades de encarar a vida por si só. Talvez a amada, ainda imortal em seu sentir, tivesse total influência na fonte de energia vital de Alberto, agora enfraquecido por uma anemia chamada morte, a morte da ‘minha metade de fora’, assim era como ele definia o que Eleonora representava para ele. Nessa sua definição havia uma questão existencial e outra até poética, que pensava ele se tivesse mais habilidade com as palavras dedicasse um breve conjunto de poemas a Eleonora. Gostava de ler, Alberto adorava a leitura. Era seletivo nos assuntos, mas limitava-se a textos não muito longos, ou livros até mais longos, mas com capítulos curtos a serem lidos esparsamente. Gostava de alguns poetas que remetiam ao romantismo alemão, da época dos compositores clássicos das sinfonias suntuosas, dos temas ideais. Por certo acabou um dia seduzido pelo ‘lado obscuro’ onde andaram Goethe e Allan Poe. Quando conheceu um poema de Poe que falava de uma Lenore que havia partido, chorou de dor e nunca mais o leu. Pensou que naquele dia havia sentido a dor de perder Eleonora, mas não fazia a menor idéia do quão profundo o corte que arrancou a metade de fora poderia ser. Doloroso e impiedoso, como o golpe do ceifador que veste negro.
Alberto continuava naquele momento as práticas meditativas e de relaxamento que vinha aprendendo. Com a imagem daquele local agradável e de sons suaves, não chegava a sentir seu corpo tocando o tecido do lençol sobre o colchão e tampouco o edredom que o cobria. Alguns fragmentos de pensamentos e ressentimentos do dia formavam certa névoa por sobre o curso d’água, mas a brisa suave de sua respiração a dispersava quase que prontamente. E nesse exercício mantinha-se calmo, tranquilamente sentindo o pulsar de seus vasos sanguíneos. O bater de dentro do peito num compasso constante e o ritmo que impunha ao entrar e sair do ar em seus pulmões faziam-no sentir dono de seu corpo e quase que dono de sua mente. Nesse momento era tomado por um alívio muito acima de um prazer imediato, intenso e passageiro ou perturbador como sexo sem amor, uma forma de conforto não só do corpo, mas do ser por completo. Sabia que era possível ir além, mas por enquanto contentava-se nesse pequeno refúgio com água, pedras e pouco verde. O mais importante era o silêncio dentro de sua mente, os barulhos exteriores já não eram ouvidos há muito.
E para esse lugar Alberto ia todas as noites antes de adormecer e nesse dia não foi diferente, adormecera.
O relógio que deixava na escrivaninha do outro lado do quarto estava marcando exatamente quatro horas e trinta e sete minutos da manhã, ainda faltava treze minutos para o despertar de Alberto. Um estrondo do lado de fora. “Talvez um trovão”, pensou Alberto logo depois de abrir os olhos devido ao susto. Manteve-se imóvel na cama e tornou a fechar os olhos, mas sabia que não iria adormecer novamente. De súbito decidiu fazer uma prece antes de levantar- se, mas não para um deus ou qualquer outra entidade que se conheça, uma prece apenas, sem destino diferente de seu próprio bem estar.
Nunca crera em doutrinas ou entidades religiosas, num deus talvez, mas não dedicava sua atenção a esses assuntos ou pensamentos. De alguma forma, essa sua nova prática diária trazia certo conforto a ele que inevitavelmente o levou a pensar que vinha de um plano realmente espiritual. Sua prece parecia se dirigir a uma imagem dele mesmo se orientando em manter a tranqüilidade da mente e os maus pensamentos habituais distantes.
Sentiu-se confortável naquele instante, mas o toque do despertador ruiu toda a tranqüilidade daquele momento e acabou por provocar um desconforto que saiu debaixo do edredom junto a ele e arrastou-se grudado em uma das pernas até meter-se de baixo do chuveiro. Um banho bem breve, apenas para que despertasse.
Alberto não assinava nenhum tipo de impresso com notícias que fosse entregue em seu domicílio, gostava de passar logo cedo, por umas duas ou três vezes na semana, na banca do Ishiro, um japonês que fala um português engraçado, e que diverte Alberto ouvi-lo falando, Ishiro tinha sabedoria e pensamento orientais, o que sempre tornava certo uns quinze minutos de conversa saudável até chegar o horário da condução.
Alberto preferia aproveitar o tempo de viagem para fazer a leitura das ‘notícias inúteis’ - essa era a definição que Alberto tinha sobre as notícias dos jornais contemporâneos – durante o trajeto e não desperdiçar tempo em casa com isso. O que tornava curto o tempo entre acordar e sair de casa.
E ao tomar sua condução para o trabalho sabia que o dia o transformaria no fantasma que se deitou ontem, o fantasma de Alberto que assombra a casa onde viveu Eleonora.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

The Funeral (Um funeral em versos)

THE FUNERAL

The son was sad
The daughter went mad
The mom cried, breathed in deeply and fell on the ground

The raven wearing its black elegant suit
Was standing, staring at every moment of that morning
While someone else was moaning

The son still cries
The daughter became angry
The mom was still lying on the grass beside the grave

The raven in a black feather coat
Was standing, staring at everyone
Wearing those pathetic black clothes

The son still cries
The daughter was turning into insanity
The mom was taken away

The raven wearing a perfect black crush hat
Was standing, staring at all those fools
And watching the gravedigger disappear beyond the hills

The son had stopped his crying
The daughter was finally hysterical
The mom was declared really dead

The raven rose from the tree, above the grave
Took a brief flight over everyone at that funeral
And landed on an old rotten log

The mom was really gone
The daughter finally got crazy
The son, the son… yes,
He said to the raven:

‘Let’s go my friend,
Who didn’t notice you
Doesn’t understand life
Doesn’t understand that we’re like grass
Waiting for a reaper,
The Grim Reaper that owns you’

The raven took another brief flight
Till the shoulder of the son
Meanwhile the coffin was buried
And the grave was sealed,
The mom was taken to a morgue
And the daughter sent to Arkham.

Probably now she’s having some fun with Joker.

And don't ask about who was dad...
It doesn't matter : now he's buried and...
He's The dead! 


RISEN

Extend your patience for a moment
Stop the desires and change the laments
Enhance your madness and move it into sadness

Pretend the light is black
The flesh is not red
And there’s nothing inside of your head

But no,
The flesh is still red and so the blood
Your hands are so far, so far away
Then they can’t make it or take it
Whatever it is

So, it is
So, it will be
So, shall we
Get into these insane dreams?

Extend your desires till they turn into laments
Stop the pattern and change the paths forever
Enhance your sadness more and more,
Turn it into madness

Pretend the darkness is light
The red is blue
And there’s nothing to see inside of you

The flush is turning, so fast, so fast
That you can’t merely see it
Your hands are so fast, so fast that you can really grab it
The flesh, the flush, the blue fish
Whatever it is

So there it is
So there it will be
So shallow it swims
Would we dare dive within?

Extend your hands for the flash
Change directions and die mad
There’s a slim chance to pretend
You’re not really dead  

CHAINED

I'll wait some more
But sometimes I think to myself
What for?

I'll ask why
And then explain the reasons
For these stains,
These chains.

Sometimes it hurts
I don't recall
Some other times it rips
I don't feel anymore

I'll ask why
And then forget the reasons
For these chains,
These stains.


ALL ENDS IN A POEM

we are all in a boat
and it’s called life
we lived our lives separated
life tore us apart
neither love nor hate
life did this to us

we are all writing some poems
anyone, anywhere, anytime
verses are in line
strophes are leaving
and poetry is the holy hole inside this boat
that make us sink like a rock
and saves us from our weird nature
and from unwanted salvation

domingo, 5 de maio de 2013

A luz da graça


Tua beleza não se mostra
Apenas através dos traços do rosto
Ela reluz toda vez em que se transformam
Num sorrir suave

Tua beleza não está
Nos contornos perfeitos
Que meus olhos veem

Também não se revela
Em teu andar sutil
Que mais se parece com um balé
Onde sou um mero expectador

Não aparece nos cabelos que descem
Ao lado da tua face alva
Tocando levemente o pescoço
E repousando por sobre os ombros
Que são como abismos onde ela cai
Até repousar por sobre as mãos delicadas
Que desenham gestos no ar
E nem é levada por elas

Toda tua beleza
Seria morta diante de mim
Sem a tua graça
A luz que me faz vê-la

De que me adianta
A graça que ilumina
Tua beleza de ninfa
Se não conheço o timbre da tua voz
E a melodia do teu falar

Qual o sentido em admirar
Teu pescoço de contorno perfeito
Sendo que nunca ouvi
O vibrar das cordas que este esconde

Meus ouvidos atentos
Desejam ser surdos
Em solidariedade aos olhos que temem
O que aqueles venham a ouvir

E de nada me serve
Essa luz absorvida por meus olhos
Que refletem todas as cores
Restando apenas a melancolia
De um azul inútil

Beleza sem a graça
Graça sem o amor
São como versos no papel
Alimentando uma traça

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Sobre meus versos

I-

Versos vividos
Versos fingidos
Versos sonhados

Não importa,
Escrever é a lei!

II-

Quero versos livres
Simples e claros
Sem dor
Sem excesso

Quero versos livres
Sem raciocínio
Sem lógica
Descomplicados e límpidos

Quero versos livres
Livres
Livres
Livres de mim
Da minha tristeza

Mas que todos permaneçam trancados em meu caderno.

III-

Uns versos vermelhos
De pena exangue
Extravasam constantemente
Outros versos ardentes
Da pena de Fênix.

Extinguem momentaneamente versos coxos
De um arremedado desejo parnasiano

Aqueles mal escritos
De meias palavras
De nenhum entendimento

O verso
O reverso
O sentido
O indesejado avesso ao verso do verso